segunda-feira, abril 21, 2008

Consultório psiquiátrico - Baseado em fatos reais (8)

"Trata-se realmente de uma vida complicada...
Quando "como você vive"
É "como você morre" "

Tony Sly




- Olá doutor, você é psiquiatra?
Olhei para seu rosto. Inédito. Quem será?
- Não, sou residente.
- Ah, é que tenho andado triste ultimamente, e não sei o que fazer...
Ele olhou para baixo. Nunca o tinha visto. Em corredores de hospital cruzamos com muitas pessoas. Reparamos em algumas, falamos com poucas, nos relacionamos com pouquíssimas, temos muito pouquíssimos amigos. Tinha comigo a chancela do acaso para justificar minha seguinte pergunta:
- Desculpe, mas de onde me conhece?
- Ah, uns amigos meus te indicaram. Disseram que você trata bem as pessoas.
O que passa na cabeça de um ser humano, nesse mundo egoísta e individualista, para ter perante a si a abertura para abordar num corredor do hospital (mais propriamente numa fila de elevador) uma pessoa que nunca viu para falar que está triste, precisando de ajuda? Passe o que passe, seja quem seja, seria no mínimo deselegante desculpar-me e sair para compensar meu atraso no ambulatório. E não o faria mesmo que tivesse todo o tempo disponível.
- Em que posso te ajudar?
E ele disse. Disse tristeza. Disse ansiedade. Disse perdas. Disse necessidades. Disse a idade. Na minha ignorância de principiante, considerei que ele não estava doente. Estava reagindo normalmente a circunstâncias estressantes da vida, o que nunca é pouca coisa.
- Pela psiquiatria, você não tem rótulo, não tem diagnóstico. Fique tranqüilo.
- Como tranqüilo? Estou cheio de problemas...
E quase chora. Cheio de problemas, e sem diagnóstico. E eu “chorei” em pensamento pelas falhas e incompatibilidades de nossa ciência rotulante que, no entanto, é o que temos de mais precioso.

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